domingo, 10 de dezembro de 2006

RESPOSTA FULMINANTE !

Othoniel Menezes, em Parnamirim Field - o primeiro, em pé, à esquerda da foto (Arquivo/Laélio)

A CAMISA COTIADA

No tempo da guerra, todo mundo sabe, muita gente se empregou em Parnamirim Field. Dentre esses pioneiros burocratas – recrutados, diziam, sob o olhar atento do pastor Doutor Mateus, tido como coronel da inteligência da USAF - estavam Othoniel Menezes, o poeta da “Praieira”; "Seu" Galvão, pai do escritor Cláudio Galvão; Dioclécio Sérgio de Bulhões, homeopata, homem boníssimo e caridoso - que mais tarde seria Vereador em Natal por muitas legislaturas; Agenor Ribeiro, depois empresário; Rômulo "Minha Gata" - que deixando Parnamirim foi para o Banco do Brasil; Emanuel Rivadávia, também, depois da guerra, do BB, servindo, inclusive, no México. Era tão fluente em inglês que foi quem leu para o General Eisenhower um discurso escrito por Othoniel, saudando o futuro Presidente dos Estados Unidos, em nome do pessoal civil da Base. Misturando-se a essa boa gente, para lá também acorreram alguns "artistas" do Grande Ponto, filhinhos-de-papai, arranhando inglês, charlando, dançando fox no Aéro, bodando na Pedro Velho...

A "sopa" (o ônibus) guiada por "Charuto", negão forte e valente, embarcava o pessoal na Pracinha (“Pedro Velho”, hoje Praça “Cívica”) e imbiocava na Parnamirim Road, a “Pista”. Fazia o pit-stop no portão da Base, ia em frente e deixava os "porcos" no Post of Engineers. "Porco", era o apelido dado aos funcionários subalternos, os operários, que viajavam nas carrocerias dos caminhões e que depois se generalizou. De Natal à Base, no ônibus, não viajando criança ou mulher - o que era raro - a esculhambação era grossa. Vida alheia, anedotas cabeludas, acenos para as “piniqueiras” no trajeto, o escambau.Othoniel Menezes, arredio, desconfiado – da raça irritável dos poetas, como afirmava Virgílio -, somente com os mais íntimos trocava piadas. Era sofrido, pobre – mas, altivo, culto e probo. Jornalista de renome, Secretário da “A República”, amigo de Café Filho, socialista, admirador de Luiz Carlos Prestes, escrevera em 1935, praticamente sozinho, o jornal “A Liberdade”. Taxado de “comunista”, passara quase três anos na cadeia. Em Parnamirim, não ligava para o apelido de "Ipecacuanha" (tinha mania por chá caseiro!). Deu o troco ao autor da proeza, o colega Dioclécio Bulhões, o homeopata, que tinha uma imponente trunfa: sapecou-lhe a alcunha de "Professor Bendengó" !

Prudente, o vate guardava distância dos "artistas" do Grande Ponto, alguns deles, até, filhos de amigos e parentes.O diabo, porém, atenta! Um belo dia, na rebarba de uma daquelas algazarras, do fundo do coletivo, ouviu, clara e maliciosa, a acaçapante e maldosa sentença: "Othoniel, poeta da camisa rasgada!"Vilipendiado, trêmulo, levantou-se e partiu pra briga. Era homem de coragem comprovada. Não conseguiu chegar à patota. Os amigos, todos, não o deixaram. A cotiada camisa que vestia, cerzida e muito limpa, carinhosamente engomada pelas mãos da sua Maria, era tão só o espelho da sua pobreza respeitável e resignada!

Não lhe pisassem, os cachorros...!

Não conseguiu identificar o autor da agressão. Nunca soube quem foi. Nunca lhe disseram.Minutos depois, já no Post of Engineers, pálido, calado, à vista dos companheiros solidários, sentou-se e, a manuscrito, em letras garrafais, numa folha de cartolina made in USA - depois afixada no Quadro de Avisos - FULMINOU o gaiato:

" A camisa rota, ó corno

- que só você foi quem viu -.

foi de uma foda no torno

com a puta que lhe pariu !”

Só então, refeito, “Ipepacuonha”esboçou um acanhado sorriso para o futuro vereador - o “Professor Bendengó” - e encerrou, para sempre, o assunto.

Laélio Ferreira

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